O crime

Não diga que me ama, você sabe que não precisamos disso. Deixe essa formalidade de lado e apenas prove isso com seus gestos. Não somos como os demais, somos a própria quebra de protocolo. Somos coagidos pela proibição. Somos meros clandestinos, dos que vivem e riem nas sombras. Dos que só podem viver verdadeiramente lá.

É na penumbra que todos escondem seus defeitos, e é lá que nos encontramos. Fazemos um do outro um erro, e desse erro, nossa virtude. Somos sinceros ao cometer este deslize, pois na escuridão não há ninguém pra nos julgar.

Não há necessidade de forjar qualquer romantismo. Os riscos que corremos nos poupa dessa falsidade formal. Não precisamos de discussões ensaiadas para nos reafirmar, nem daquelas perfeitas alvoradas de domingo. Quem gosta das manhãs nem desconfia do que se passa pelas madrugadas. 

Num encontro noturno a verdade se esclarece. Ali, vivemos. Sem nos ver, sem quase nos ouvir. Vivemos apenas no sentir. No sentir o outro, no sentir em estar ali.

Depois da entrega, fingimos que não nos conhecemos. Passamos a ser meros estranhos inocentes. Mas isso não dura muito. Passam alguns dias e logo volta o olhar discreto, o carinho despercebido, e tudo começa novamente. Deixamos a aliança na mesa de cabeceira.

Fala-se muito que cumplicidade é algo necessário num relacionamento. Porém, só existem cúmplices se existir crime.