Cavaleiros apelados

Calmaria. O som da bandeira tremulando desengonçada, as nuvens andando sorrateiramente pelo céu, a grama dançando em perfeita harmonia. Ao passar por aqueles campos ainda verdejantes, o frio e suave sopro de vento parecia anunciar a chegada da morte, que naquela tarde ainda teria muito trabalho a fazer.

Amigos, ou irmãos por escolha, degustavam do que restava da calmaria. Cumprimentaram-se com um aperto no antebraço, no fundo desejando fazer isso novamente ao cair do sol. Olharam-se uma última vez e abaixaram os elmos. Era chegada a hora.

O vento parava de soprar. Ouviam e sentiam-se apenas os passos firmes e simultâneos daqueles cavaleiros apelados, que iam em direção ao que conheciam da vida. Pouco a pouco, a marcha ia perdendo sua sincronia militar. Os passos iam ficando mais fortes, mais rápidos, mais desesperados... Até que então, não eram mais soldados marchando: eram animais em cólera.

Num breve intervalo de tempo onde não se pensa, distinguem-se três momentos:
O desembainhar das espadas. O grito dos homens. O choque dos escudos.
Caos.

Naquele campo não havia mais terras, deuses ou ideais para se combater. Lutava-se apenas pela sobrevivência. Os suaves estalos que a grama fazia sob o vento davam lugar ao som de lâminas perfurando corpos. Durante toda uma tarde, soldados matavam e morriam sem saber por que, fazendo pintar todo aquela gramado em escarlate.

Até que então, a calmaria retorna. Dessa vez, com tremular de bandeiras caídas, nuvens estáticas cobrindo o céu, e corpos ensanguentados impedindo o dançar da grama. Irmãos se cumprimentavam com um aperto no antebraço. Poucos tiveram a mesma sorte.

O sol parecia ir embora envergonhado, mas os homens comemoravam! Voltavam para casa inspirados, com a falsa sensação de terem sobrevivido. Mal sabiam eles, coitados, que estavam só vivos para poderem morrer outro dia.